Lara acordou com o coração repleto de esperanças... Uma sensação nova a preenchia: o gosto do novo.
Era o último dia do ano, e as pessoas confiavam no tempo como sendo o senhor maioral de todas as premissas. Era como se naquele dia os problemas parassem e a chegada da nova data anunciasse apenas as soluções para o que quer que fosse.
Lara ficaria em casa, pois recusara todos os convites que recebera para passar um réveillon supostamente inesquecível. Mas ela estava bem, muito bem aliás, naquele dia pôs a cabeça pra funcionar e passou a pensar em todas as coisas que tinha evitado: os sonhos que realizara e os que não realizara, os desejos, as coisas todas que compuseram seu aprendizado até ali. Esse foi o único dia em que ela não pensou em como deveria ser a morte ou ensaiou o que faria depois que seu espírito deixasse o corpo.
Nesse emaranhado de pensamentos o dia passou rápido, e logo a noite chegou. Lara estava só e na sua condição primordial: FELIZ DA VIDA!
À meia noite os fogos coloriram o céu e o peito acumulado de coragem, deu-lhe forças para pegar o telefone:
- Oi Natália. Sou eu, Lara.
- Sim.
- Feliz Ano Novo.
- Obrigada. – respondeu a ex, secamente.
- De nada. – falou Lara, ensaiando as palavras certas – Olha... eu queria muito conversar com você, aliás queria te ver e conversar pessoalm...
- Lara – Interrompeu Natália – muito obrigada por ter ligado. Eu desejo que você tenha um ano maravilhoso e que seja muito feliz, mas sinceramente não tenho motivos pra te ver ou conversar. Não faz sentido, entende?
- Entendo. Desculpe-me, mas eu preciso mesmo te ver.
- Quando eu puder eu vou aí, tá? Agora preciso desligar.
- Tudo bem.
E assim começava o ano de Lara: com a esperança de que as duas conversariam quando Natália pudesse, ou quisesse.
Depois da ligação, Lara deitou no sofá e adormeceu. Despertou mais tarde com a campainha tocando. Era Sílvia, amiga de longa e também ex namorada dos tempos antigos:
- Feliz Ano Novo! – disse com toda a animação enquanto abraçava Lara.
- Feliz Ano Novo Sil. – respondeu Lara com a mesma animação.
- E aí... vai fazer o que no primeiro dia do ano?
- Ficar em casa. Não to muito a fim de sair não.
- Hum... Tudo bem. Eu também não tava muito a fim de sair.
- Fica aqui comigo. Você pode cozinhar pra gente! Que tal? – brincou Lara.
- Ah, espertinha! Fazer o que né? – riu Silvia fingindo não ter outra opção.
Aproveitando o momento descontraído Lara contou à amiga, com quem tudo dividia, sobre o telefonema e sobre a forma como Natália se mostrara insatisfeita ao falar com ela.
- Ah Larinha, você também tá deixando que ela te faça de gato e sapato – disse a amiga em tom de reprovação.
- Não é isso. Ela se zangou comigo. Eu falei coisas ruins.
- Lara, todo mundo fala coisas ruins em algum momento. Quantas vezes ela te tratou mal? Quantas vezes te magoou com atitudes?
- Isso é passado. Já nem penso nessas coisas.
- Tá vendo? Você perdoou. Por que ela não pode fazer o mesmo?
- Não é simples assim Sil. E além do mais, as pessoas são diferentes.
- Ah, você é quem sabe. Só não acho justo você ficar dando murro em ponta de faca! Você precisa seguir em frente, viver o que é pra ser vivido e pronto. Deixa isso pra lá.
- Você sabe que não posso! E não creio que o maior problema nessa história seja a falta de perdão, acho que agora falta é amor. Ela não sente mais nada.
- É. Falta amor, sim – disse Silvia indignada – falta amor próprio, e de sua parte. Lara você é uma mulher linda, madura, incrível...
- Ah, pára com isso – sorriu sem graça.
- É verdade Lara, não é certo o que você ta fazendo consigo mesma. Porque dessa vez, sou obrigada a dizer, que é você quem está procurando pelo sofrimento.
- Quero me despedir. Só isso.
- O que? Vai contar pra ela? Tem necessidade?
- Não. Não vou contar. Mas queria vê-la mais uma vez.
- Ai Larinha, eu não sei se é uma boa ideia. Você pode se machucar mais ainda, e...
- Eu não tenho nada a perder. – disse com voz firme, colocando um ponto final na conversa.
[CONTINUA...]