- Então é assim? Ela vai embora de casa viver as aventurinhas pecaminosas, se dá mal, aí manda você me ligar? – gritava a mãe de Lara ao telefone.
- Desculpa D. Agnes, mas acho que a senhora não entendeu. Ela não me pediu que te ligasse, mas quando eu sugeri, ela concordou. O estado de Lara é grave, deixe-me explicar de novo.
- Nem pensar! Lara que se vire. Isso é castigo de Deus, por todos os pecados e orgias que vocês praticaram.
- Como diz isso? Você é mãe dela. – dizia Silvia indignada. – Não houve pecado algum, muito menos orgias. Somos homossexuais e não promíscuas.
- Essa é boa. Pra mim dá no mesmo. Escute aqui, não me interessa o que Lara tem. Não é de minha conta, ela deixou de ser minha filha no dia em que saiu por aquela porta pra se casar com você, entendeu?
- Não somos mais casadas D. Agnes. Separamos-nos há dois anos.
- Não me interessa. Já disse, a vida dela não me diz respeito.
- Tudo bem, é sua escolha. Espero que não se arrependa, poderia me dar o telefone do pai de Lara? Preciso falar com ele.
- Eu não tenho – mentiu.
- Tudo bem.
Agnes caiu em prantos ao desligar o telefone, mas o seu orgulho e seu preconceito a impediam de amar e aceitar a filha como ela era e provavelmente a impediria de ao menos visitá-la uma vez que fosse, fazendo com que seu coração se banhasse no lodo do arrependimento – uma capa feia e pesada que torna o outro lado da rua mais distante do que ele realmente é.
Quando Lara saiu de casa, aos 18 anos, fora viver com Silvia. Não a amava, mas estava muito envolvida e muito feliz, pensou que aprenderia a amá-la, namoraram quase dois anos, e depois se separam, numa boa. Tanto que continuaram amigas.
Tempos depois Natália apareceu na vida de Lara e ela se apaixonou de verdade pela primeira vez. Naty morria de ciúmes e dava crises terríveis quando o assunto era a amizade entre Lara e Silvia. Aos poucos tudo foi se ajeitando, mas por conta de grandes desentendimentos e pouco diálogo os corações, antes apaixonados, começaram a ficar machucados e o amor foi murchando dolorido. E nada mais podia ser feito. Conversaram e também terminaram. Ambas sofreram muito durante muito tempo, mas que podiam fazer senão se conformar?
Durante muitos meses Lara aceitou. Tiveram muitas discussões por causa desse tal amor inacabado. Volta e meia Natália magoava Lara, talvez, sem nem perceber, mas o fazia. Ou talvez Lara estivesse frágil demais. Vai saber... Mas sempre acabava do mesmo jeito: Lara desculpava as mancadas de Natália e seguia magoada, tentando estancar as feridas. E Natália seguia seu rumo, sem prumo, sem sentido, aceitando tudo, até o amor que lhe fora dado por “um tal de namorado” que resolvera arranjar – para desespero de Lara.
Por fim, veio a pior das discussões. Com os ânimos pra lá de exaltados, Lara acabara por magoar Natália na mesma intensidade que a mesma a magoara durante todo o tempo em que ficaram separadas, e a diferença é que Lara sabia lidar com a dor, mas Natália não soube. E pior, não soube lidar com o amor, aquele que entende, que perdoa e que releva alguns tropeços. Essa discussão acabou com um “me esqueça, abri mão de você”, que Lara guardaria para todo o sempre.
(CONTINUA...)